sexta-feira, 1 de julho de 2011

Fecundação "post mortem" e direitos hereditários. Nasce o primeiro bebê brasileiro gerado após a morte do pai.

Fecundação “post mortem” e direitos hereditários

Dia 27 de junho de 2011 nasceu em Curitiba o primeiro bebê gerado por fecundação artificial "post mortem" no Brasil. Seu nome é Luiza Roberta Niels.


Particularmente apoio a prática médica - resguardada juridicamente pelo código civil (que em seu art. 1597 estabelece que: “Presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos: ... III- havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido”) – e em segundo plano, resguardada eticamente pela Resolução 1.957/2010 do CFM (“VIII – REPRODUÇÃO ASSISTIDA POST MORTEM: “Não constitui ilícito ético a reprodução assistida post mortem desde que haja autorização prévia específica do(a) falecido(a) para o uso do material biológico criopreservado, de acordo com a legislação vigente”.
Acho um ato de amor e defendo o direito procriativo da mulher que desejou sinceramente esta criança.


Como este site trata de bioética, permitam-me comentar algumas linhas sobre os direitos patrimoniais. Como fica o direito hereditário da criança nascida por fecundação “post mortem”?



A Resolução 1.957/2010 CFM, no item V - CRIOPRESERVAÇÃO DE GAMETAS OU EMBRIÕES, orienta que “3 - No momento da criopreservação, os cônjuges ou companheiros devem expressar sua vontade, por escrito, quanto ao destino que será dado aos pré-embriões criopreservados em caso de divórcio, doenças graves ou falecimento de um deles ou de ambos, e quando desejam doá-los”. A própria clínica de fertilização “in vitro” deverá guardar este documento de disposição de vontade por escrito – que esclarecerá o que será feito ao embrião criopreservado. Luiza não foi um caso de implantação de embrião, mas de inseminação por sêmen congelado.

A mesma Resolução, em seus Princípios Gerais (I), 3, orienta ainda que: “O consentimento informado será obrigatório a todos os pacientes submetidos às técnicas de reprodução assistida, inclusive aos doadores. Os aspectos médicos envolvendo as circunstâncias da aplicação de uma técnica de RA serão detalhadamente expostos, assim como os resultados obtidos naquela unidade de tratamento com a técnica proposta. As informações devem também atingir dados de caráter biológico, jurídico, ético e econômico. O documento de consentimento informado será expresso em formulário especial e estará completo com a concordância, por escrito, das pessoas submetidas às técnicas de reprodução assistida.


A Resolução 1.957/2010, muito bem elaborada e importante guia deontológico, fala a todo tempo de consentimento informado, mas não explicita em nenhum momento que o consentimento poderá ser retirado a qualquer momento. Se o material genético do “de cujus” estava disponível na clínica, é porque este tinha um projeto parental a ser realizado – uma vez que armazenou seu sêmen antes da quimioterapia, com intenção de ter um filho. Se o consentimento nãofoi retirado, presume-se que o desejo de ter um filho ainda existia quando faleceu. Mas o que diz a lei?


O Código Civil, em seu artigo 1.798, ao tratar da vocação hereditária, estabelece que: “legitimam-se a suceder as pessoas nascidas ou já concebidas no momento da sucessão”. Se Luiza não havia sido concebida, este artigo não lhe socorre em relação aos direitos patrimoniais.


Entretanto, o artigo 1.799 abre uma possibilidade: “Na sucessão testamentária podem ainda ser chamados a suceder: I- Os filhos, ainda não concebidos, de pessoas indicadas pelo testador, desde que vivas estas ao abrir-se a sucessão”. Assim, havia uma hipótese de Luiza ter direitos patrimoniais se seu pai houvesse deixado um testamento indicando como herdeiros seus filhos gerados “post mortem” (através de seu material genético congelado).


Como a sua parte hereditária seria resguardada? Conforme reza o art. 1.800 do CC: “no caso do inciso I do artigo antecedente, os bens da herança serão confiados, após a liquidação ou partilha, a curador nomeado pelo juiz”... “§3°. Nascendo com vida o herdeiro esperado, ser-lhe-á deferida a sucessão, com os frutos e rendimentos relativos à deixa, a partir da morte do testador”. “§4°.Se, decorridos dois anos após a abertura da sucessão, não for concebido o herdeiro esperado, os bens reservados, salvo disposição em contrário do testador, caberão aos herdeiros legítimos”.


Nada impede, entretanto, que Luiza seja chama à sucessão por herança que venha tocar a seu pai morto.


Desta forma entendo que neste caso não há lacuna no direito brasileiro. A solução para estabelecer direitos patrimoniais de bebê nascido por fecundação “post mortem” está na lei.

Para outras informações, visite o portal http://www.cremepe.org.br/leitorClipping.php?cd_clipping=45312

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